DESASSOCIAÇÃO COMO A BÍBLIA RECOMENDA?
Copyright © 2000 William Gadêlha
O Corpo Governante determina que sejam desassociados (excomungados) todos aqueles dentre as Testemunhas de Jeová que não concordem com todos os ensinos que dele emanam. Será que este tipo de desassociação tem base bíblica?
O principal texto usado pela Sociedade ao justificar a medida da desassociação é o de 1 Coríntios 5:11:
"Mas, eu vos escrevo agora para que cesseis de ter convivência com qualquer que se chame irmão que for fornicador, ou ganancioso, ou idólatra, ou injuriador, ou beberrão, ou extorsor, nem sequer comendo com tal homem."
Que tipo de pessoa é esta? O próprio versículo 13 deste mesmo capítulo define o praticante de todas estas coisas:
"Removei o [homem] INÍQUO de entre vós."
Mesmo que o termo "desassociação" não apareça na Bíblia, a idéia e o princípioestão, sem dúvida, presentes por meio da palavra "removei". Mas a quem se aplica este texto? Ao iníquo, isto é, a pessoa que, de modo contumaz, pratica quaisquer das transgressões acima alistadas, ao ponto de ser corretamente chamada de fornicador, idólatra, beberrão, etc. Este é o tipo de pessoa de quem Paulo disse que se deveria "remover" dentre os cristãos. Tal pessoa poderia ser como o "fermento que leveda a massa toda". (Gálatas 5:9) Mesmo em relação a estes, porém, o que quer dizer exatamente este texto?
Como a Bíblia Recomenda?
Se examinar a página 1318 da Tradução do Novo Mundo com Referências(1986), observará na nota de rodapé que "cesseis de ter convivência"corresponde à palavra grega mesynanamígnsthai, que significa literalmente "não vos mistureis com".
Em A Sentinela de 15 de dezembro de 1981, página 21, parágrafo 23, a Sociedade condena que se dê um simples "oi" a uma pessoa desassociada. Esta é, no entanto, uma instrução humana, que vai ALÉM do que diz o texto de 1 Coríntios 5:11.
Observe ainda que 1 Coríntios 5:11 não menciona pessoas que, usando a Bíblia, discordem de algum ensino que a mesma, de fato, não traz.
Será que este texto incluiria não cumprimentar a pessoa?
Para entender este ponto, leia 2 Tessalonicenses 3: 14, l5:
"Mas, se alguém não for obediente à nossa palavra por intermédio desta carta, tomai nota de tal, parai de associar-vos com ele, para que fique envergonhado. Contudo, não o considereis como inimigo, mas continuai a admoestá-lo como IRMÃO."
O contexto indica, e o próprio Corpo Governante reconhece, que aqui não se está falando de pessoas "removidas" dentre os cristãos; essas deveriam ser admoestadas como irmãos.
É digno de nota que, tanto em 1 Coríntios 5:11 como em 2 Tessalonicenses 3:14, a palavra grega utilizada seja a mesma, mesynanamignsthai. Isto pode ser conferido numa publicação da própria Sociedade, a Tradução Interlinear do Reino das Escrituras Gregas, páginas 743 e 910 (em inglês). A Sociedade, no entanto, traduziu esta mesma palavra grega de dois modos ligeiramente diferentes: em 2 Coríntios 5:11 é "cesseis de ter convivência com"; em 2 Tessalonicenses 3:14 é "parai de associar-vos com". Mesmo que você não entenda inglês, poderá examinar as páginas 1318 e 1366 (Tradução do Novo Mundo com Referências, 1986), nas notas de rodapé referentes a 1 Coríntios 5:11 e 2 Tessalonicenses 3:14. Comparando as duas verá que a tradução literal de ambas é "não vos mistureis com".
Portanto, o que a Bíblia diz é que o tratamento dispensado tanto aos "removidos" (desassociados) por conduta imprópria, como aos "tomados nota" é o de não se misturar com eles, isto é, não ter com eles intimidade, companheirismo, convivência. O tratamento, conseqüentemente, é o mesmo! Tanto num caso como no outro não se fala em não dirigir a palavra à pessoa, não cumprimentá-la. Isto, naturalmente, não corresponde ao entendimento ou interpretação do Corpo Governante, mas é tão-somente o que está escrito na Bíblia, e 1 Coríntios 4:6 diz: "Não vades além das coisas que estão escritas."
O outro texto básico em que o Corpo Governante se apóia na questão da desassociação é 2 João 10, 11, que diz:
"Se alguém se chegar a vós e não trouxer este ensino, nunca o recebais nos vossos lares, nem o cumprimenteis. Pois, quem o cumprimenta é partícipe das suas obras iníquas."
O texto é bem claro e nós devemos aceitá-lo. Não se deve receber em casa e nem cumprimentar os que não trouxerem "este ensino". Que ensino é este?
O versículo 9, anterior, esclarece:
"Todo aquele que se adianta e não permanece no ensino do Cristo não tem Deus. Quem permanece neste ensino é quem tem tanto o Pai como o Filho".
O versículo 7 é ainda mais específico, dizendo:
"Pois muitos enganadores saíram pelo mundo afora, pessoas que não confessam Jesus Cristo vindo na carne. Este é o enganador e o anticristo".
Este é o anticristo, uma categoria de pessoas, pessoas que não aceitam Jesus como o Messias, como tendo vindo na carne. Isto é que é, definido pela própria Bíblia, o "ensino do Cristo". Aquele que "não trouxer este ensino" está na categoria de anticristo. Este é que não deve ser recebido nos lares dos cristãos e nem ser cumprimentado por eles.
O Que É e o Que Não É o Ensino de Cristo
Podemos até estender-nos mais um pouco acerca do "ensino do Cristo", recordando algumas coisas que o próprio Jesus declarou:
"Continuai a amar os vossos inimigos e a orar pelos que vos perseguem." – Mateus 5:44.
"Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim." – Mateus 14:6.
"Deveras eu te digo hoje: Estarás comigo no Paraíso." – Lucas 23:43.
"Não vos maravilheis disso, porque vem a hora em que todos os que estão nos túmulos memoriais ouvirão a sua voz e sairão, os que fizeram boas coisas para uma ressurreição de vida, os que praticaram coisas ruins, para uma ressurreição de julgamento." - João 5:28, 29.
"A menos que comais a carne do Filho do homem e bebais o seu sangue, não tendes vida em vós mesmos." – João 6:53.
"O Pai é maior do que eu." – João 14:28.
Todas estas foram coisas ensinadas por Cristo. Poderiam, portanto, apropriadamente ser chamadas de ensinos do Cristo.
Aquele que viesse a negar quaisquer destas verdades bíblicas básicas, relacionadas com Cristo deveria, sem dúvida, receber o tratamento decretado em 2 João 10, 11.
Agora, imagine que, em diversas partes da Bíblia, Jesus tivesse ensinado as seguintes coisas:
"Prestai atenção ao fim dos 7 Tempos dos Gentios, pois então serão destruídos os reinos da terra e sereis transferidos para o céu. Neste mesmo ano serei entronizado nos céus."
"Pouco depois disso [1918], iniciar-se-á a ressurreição invisível de muitos de vós".
"Mais um pouco [1919], e após inspecionar todas as religiões da cristandade, designarei os membros da Sociedade Torre de Vigia como meu Escravo Fiel e Discreto".
"Ficai atentos, alguns anos depois destas coisas, ao cumprimento maior dos jubileus que existiam sob a Lei de Moisés; ao se cumprirem [1925], ocorrerá a ressurreição terrestre de fiéis servos de Deus do passado, como Abraão, Josué e Davi."
"Ao se concluírem 6.000 anos da criação do homem [1975], começará o Reinado Milenar."
"Antes de extinguir-se a geração que testemunhar o fim dos Tempos dos Gentios [em 1914] virá o fim do sistema de coisas."
"Comei e bebei, todos vós, mas só se fordes dos 144.000, apesar do que está escrito em João 6:53."
"Sede obedientes a um Corpo Governante que tomará a dianteira entre vós daqui a 19 séculos, mesmo que ensinem coisas que não estão nas Escrituras. Os erros deste Corpo, mesmo que resultem em falsas profecias e perda de vidas [antigas proibições de vacinas e transplantes] serão perdoados, mas vós, se não o obedecerdes, não tereis perdão."
É claro que Jesus nunca ensinou nenhuma das coisas mencionadas acima. Uma boa parte delas, todavia, já foi ensinada como verdade pela Sociedade e depois foram revogadas. Outras são ensinadas até o dia de hoje. Essas nunca fizeram parte do "ensino do Cristo", e no entanto, foram trazidas aos lares de milhões de pessoas. O que é mesmo que está escrito em 2 João 10,11?
"... nunca o recebais nos vossos lares."
Em tempos recentes, em vários países, pessoas foram desassociadas ÚNICA e EXCLUSIVAMENTE por terem discordado de ensinos como esses. Apesar de nunca terem deixado de crer em Jesus como Messias, de nunca terem negado sua vinda em carne e sua morte sacrificial e nem os ensinos que ele claramente deixou, passaram a ser tratadas como o "anticristo" de 2 João 7. Embora não tivessem abandonado o "ensino do Cristo" passaram a ser rejeitadas como pessoas a quem não se devia cumprimentar. Tampouco praticaram a iniqüidade de 1 Coríntios 5:11, e assim mesmo foram consideradas como pessoas iníquas, indignas da associação cristã e merecedoras da destruição.
A pessoa que, de modo franco, analisar estes textos bíblicos só pelo que eles dizem, à parte de interpretações humanas passíveis de erro e de correções, perceberá claramente a sua aplicação distorcida.
Mais Textos a Considerar
Atos 20:30:
"Dentre vós mesmos surgirão homens e falarão coisas deturpadas, para atrair a si os discípulos."
As "coisas deturpadas" aqui mencionadas têm de ser deturpadas em relação ao que a Palavra de Deus diz, têm de ser deturpações do verdadeiro ensino bíblico, e não de doutrinas humanas.
Romanos 16:17,18:
"Exorto-vos agora, irmãos, que fiqueis de olho nos que causam divisões e motivos para tropeço contra o ensino que aprendestes, e que os eviteis."
Paulo escreveu esta carta por volta de 56 da Era Cristã, e ela foi dirigida originalmente aos membros de uma congregação cristã daquela época. Não foi escrita no século 20, e nem especificamente ao grupo religioso "Testemunhas de Jeová". Portanto, quando Paulo exortou os cristãos do primeiro século a ficarem de olho nos que causavam motivos para tropeço contra o ensino que tinham aprendido, a que ensino se referia ele? Não poderia ser, por exemplo, o ensino de que o reino de Cristo se estabeleceria nos céus em 1914, pois esta data não é ensinada na Bíblia, e seguramente não fazia parte do ensino que os cristãos do primeiro século haviam recebido dos apóstolos. Referia-se ao ensino declarado nas Escrituras, e não aos ensinos FUTUROS de uma determinada organização religiosa e após o primeiro século não houve escritos divinamente inspirados.
Tito 3:10:
"Quanto ao homem que promove uma seita, rejeita-o depois da primeira e da segunda admoestação."
Novamente, para promover uma seita, é preciso que se propale um ensino divergente do ensino do verdadeiro cristianismo, que só pode ser encontrado na Bíblia. Questionar algo que carece de apoio nas Escrituras não é "promover uma seita", ainda mais quando não se tem a intenção de criar ou fundar um novo grupo religioso.
Hebreus 13:17:
"Sede obedientes aos que tomam a dianteira entre vós e sede submissos."
A Sociedade usa este texto como que requerendo a obediência não apenas aos anciãos congregacionais e aos superintendentes viajantes como também ao próprio Corpo Governante de Brooklyn, no que quer que eles ensinem. Naturalmente que os cristãos estão sob obrigação bíblica de obedecer aos seus pastores. Mas, não é menos bíblico dizer que esta obediência é RELATIVA. O que deve alguém fazer quando, em qualquer organização religiosa, os da dianteira (padres, pastores ou anciãos) tentam lhe impor algo que não tem apoio na Bíblia? A resposta está em Atos 5:29:
"Temos de obedecer a Deus como governante antes que aos homens".
O Caso de Himeneu e Fileto
"Mas esquiva-te dos falatórios vãos que violam o que é santo; porque passarão a impiedade cada vez maior e a palavra deles se espalhará como gangrena. Himeneu e Fileto são desses." – 2 Timóteo 2:16,17.
Este texto tem sido bastante citado pela organização, ao condenar os que contestam seus ensinos. Ela tem rotulado de "apóstatas" os que dela saem por não mais concordarem com as doutrinas e normas oriundas do Corpo Governante. Atribui aos que discordam os "falatórios vãos que violam o que é santo", para justificar sua atitude de pô-los no ostracismo. Ao invés de dar razão à Sociedade, porém, esta passagem é um claro exemplo bíblico do que corretamente pode se chamar de apostasia.
Himeneu e Fileto eram evidentemente culpados de apostasia na primitiva congregação cristã. Em que consistia tal apostasia?
Responde-nos 2 Timóteo 2:18, em continuação do texto anterior:
"Estes mesmos se desviaram da verdade, dizendo que a ressurreição já ocorreu, e estão subvertendo a fé de alguns."
Aí está. Esses dois homens que haviam sido membros da congregação cristã do primeiro século estavam desviados da verdade de Deus, dos ensinos que os apóstolos escreveram e transmitiram sob inspiração divina. Ao dizerem que já ocorrera algo que ainda estava para ocorrer no futuro (a ressurreição), eles apostataram, e além disso, desviaram outros do verdadeiro cristianismo, pois "subverteram a fé de alguns".
Em A Sentinela de 15 de julho de 1985, páginas 31 e 32, a Sociedade considera o texto de 2 João 10. Um leitor pergunta se ele se aplica apenas aos que promovem doutrinas falsas. A análise da Sociedade procura confundir o leitor, primeiramente fazendo uma conexão com 1 Coríntios 5:11 (que como já vimos, trata de conduta imoral); depois faz outra conexão para Revelação 21:8 (que já trata dos pecados que merecem a segunda morte), e finalmente vai para 1 João 2:18,19, que fala dos que "saíram do nosso meio, mas não eram dos nossos; pois se tivessem sido dos nossos teriam permanecido conosco". Ora, este último texto também se refere claramente ao anticristo (versículos 18 e 22), "aquele que nega o Pai e o Filho"!
O artigo fala ainda dos que "repudiam a congregação de Deus", por "renunciar à sua fé" e por se "dissociarem". Diz:
"Tais pessoas que voluntariamente abandonam a congregação cristã tornam-se, desta forma, parte do 'anticristo'".
Mais uma vez, lembramos que a aplicação do termo "apóstatas" aos que rejeitam os ensinos desta (ou de qualquer outra) organização religiosa, precisa ajustar-se ao requisito de que os ensinos rejeitados sejam, de fato, bíblicos, sejam verdades definitivas e inquestionáveis. Rejeitar ensinos de origem humana NÃO É APOSTASIA.
Para exemplificar: Charles Taze Russell, Joseph Franklin Rutherford, Nathan Homer Knorr e Frederick William Franz (os quatro primeiros presidentes da Torre de Vigia) receberam sua formação religiosa respectivamente das igrejas Presbiteriana, Batista, Reformada e Presbiteriana (Proclamadores, páginas 42, 67, 91 e 111). Todos estes ABANDONARAM suas anteriores organizações religiosas, REJEITANDO assim alguns de seus ensinos que não tinham fundamento bíblico, tais como a trindade e a imortalidade da alma. Poderiam eles ter sido classificados como apóstatas pelas igrejas das quais saíram ? Biblicamente, não! Poderiam essas igrejas CORRETAMENTE tê-los designado como "anticristo", pelo fato de eles terem abandonado aquilo que, ATÉ ENTÃO, tinham considerado como a verdadeira igreja (ou congregação) cristã? Não, pois todos eles continuaram a crer em Deus e em Jesus como Messias, não é verdade?
Do mesmo modo, não é por alguma coisa ser ensinada pelo Corpo Governante das Testemunhas de Jeová que ela se torna, automaticamente, uma verdade bíblica. As crenças de qualquer organização que se considere cristã DEVERIAM estar, de modo cristalino, em harmonia com a Palavra de Deus, nada lhe acrescentando ou retirando. A Bíblia, esta sim, deveria ser a única fonte de verdade indiscutível. A Sociedade Torre de Vigia se jacta de ser a única religião que segue TOTALMENTE a Bíblia, enquanto acusa as demais religiões da cristandade de serem "seguidoras de homens".
Mas observemos, a respeito, algumas declarações feitas em publicações da Sociedade:
Anuário das Testemunhas de Jeová de 1976, página 106:
"Em essência, mostramos que a Sociedade é uma organização inteiramente religiosa; que os membros aceitam como seus princípios de crença a santa Bíblia, conforme explicada por Charles Taze Russell." – Esta declaração foi feita na época da 1ª Guerra Mundial e, como se pode ver, não era exatamente a Bíblia que delineava as crenças dos membros da organização, mas a Bíblia CONFORME EXPLICADA POR CHARLES RUSSELL! Poderíamos perfeitamente substituir aqui a palavra "explicada" por "interpretada", interpretada por UM HOMEM.
O tratado Notícias do Reino número 1, citado no Proclamadores, página 69, último parágrafo, diz: "Intolerância Religiosa – Perseguidos os Seguidores do Pastor Russell por Falarem a Verdade ao Povo". – A expressão "seguidores do Pastor Russell" foi utilizada por uma publicação da própria Sociedade, citada em outra literatura da própria Sociedade: os membros da organização ERAM SEGUIDORES DO PASTOR RUSSELL.
Em A Sentinela de 1 de abril de 1986, página 31, encontramos uma idéia semelhante, embora expressa com maior sutileza:
– "A associação aprovada com as Testemunhas de Jeová requer a aceitação de toda a série dos verdadeiros ensinos da Bíblia, inclusive as crenças bíblicas singulares das Testemunhas de Jeová."
Segundo um dicionário de Aurélio Buarque, a palavra "SINGULAR" quer dizer "pertencente só a um", "distintiva", "privativa".
Mais uma vez não bastou declarar que os ensinos bíblicos eram suficientes, mas que é preciso aceitar as crenças privativas das Testemunhas de Jeová, suas crenças "SINGULARES", e estas SE ORIGINAM DO CORPO GOVERNANTE.
Quais são, então, as crenças singulares das Testemunhas de Jeová?
Elas nada têm a ver com a Trindade, pois os cristadelfianos e os unitários TAMBÉM não a aceitam. Também não é a descrença na alma imortal e no inferno de fogo, pois os adventistas também não acreditam nisso; tampouco é a crença num vindouro paraíso terrestre, já que igrejas até mais antigas do que a Torre de Vigia também têm essa esperança.
A revista já citada dá exemplos destas "crenças singulares", e entre essas estão a existência de um Corpo Governante (termo inexistente na Bíblia), representante do "escravo fiel e discreto"; que 1914 marcou o fim dos Tempos dos Gentios, o estabelecimento do reino de Deus nos céus e a presença invisível de Jesus Cristo; e que apenas 144.000 receberão a recompensa celestial. Todas estas crenças "singulares" resultam de interpretações forçadas das Escrituras, e não podem ser biblicamente comprovadas. Ocorre porém, que a interpretação de homens não pode ter o mesmo peso de uma declaração direta da Palavra de Deus! Foi exatamente por isso que Jesus, certa vez, condenou os fariseus de seu tempo. Mateus 15:9 diz:
"É em vão que persistem em adorar-me, porque ensinam por doutrinas os mandados de homens."
Os que não aceitam tais crenças são considerados como promotores de ensinos falsos, de apostasia! Se aqueles que atualmente deixam a organização da Torre de Vigia por discordarem dessas crenças são apóstatas, certamente que Russell, Rutherford, Knorr e Franz TERIAM SIDO APÓSTATAS TAMBÉM, apóstatas em relação às suas anteriores religiões. Afinal de contas, segundo dicionário de Aurélio Buarque APOSTASIA é: 1. Separação ou deserção do corpo constituído ao qual se pertencia. 2. Abandono da fé de uma igreja.
E APOSTATAR é: 1. Desertar (da fé). 2. Mudar (de religião ou de partido). Exemplo: Apostatou da religião de seus pais.
Ou adotamos este conceito amplo de apostasia, admitindo assim a existência de apostasias católica, batista, presbiteriana, adventista, das Testemunhas de Jeová (e neste caso, toda TJ que já fez parte de outra religião é apóstata), ou nos apegamos ao conceito bíblico de que apostasia é o abandono de qualquer doutrina ou ensinamento definitiva e inquestionavelmente expresso na Palavra de Deus.
Motivos
Apropriadamente vem a pergunta: Por que adota o Corpo Governante essas normas tão autoritárias de desassociação que VÃO ALÉM do que a Bíblia diz?
Conforme explica Raymond Franz, ex-membro desse Corpo Governante, em seu livro Em Busca da Liberdade Cristã (em inglês), página 342:
"Por meio da norma que proíbe falar com aqueles a quem ela arbitrariamente designa como 'apóstatas', a organização da Torre de Vigia não só mantém um ambiente 'esterilizado' entre os seus membros, assegurando-se de que eles não venham a ser confrontados com qualquer evidência convincente dos erros da organização, como também a organização se livra de ter, ela mesma, de responder a tais evidências."
Essa é a razão. Um verdadeiro regime de quarentena é imposto aos que saem da organização, com o objetivo de impedir que os questionamentos bíblicos cheguem aos membros e objetivando perpetuar sobre eles o domínio de uma classe que se considera especialmente iluminada por Deus e oficialmente designada para governar as vidas de milhões de pessoas.
As razões do Corpo Governante não parecem diferir, neste aspecto, das dos padres, bispos, pastores e líderes de outras denominações religiosas, quando advertem seus fiéis a não darem ouvidos à pregação das Testemunhas de Jeová. A nenhum deles interessa sofrer desfalques em seus rebanhos. Nem a eles, nem ao Corpo Governante.
Minúcias Legalísticas
Há, ainda, que se ressaltar a incrível fabricação de minúcias legalísticas relacionadas à desassociação, por parte da Sociedade. Ela determina, por exemplo:
- Pode-se falar com desassociados por motivos profissionais ou comerciais.
- Só os anciãos podem falar com desassociados, visando a trazê-los de volta para a organização.
- Só se deve ter associação com parentes desassociados o mínimo necessário.
- Se os parentes desassociados moram na mesma casa, pode-se falar com eles, mas não sobre assuntos espirituais.
Onde faz a Bíblia tais especificações? Simplesmente elas não existem! Trata-se de uma série de regulamentos estabelecidos pelo Corpo Governante, no uso de seus auto-conferidos poderes legislativos. Isto quer dizer que, mesmo que alguém seja tido como apóstata, ainda se pode falar com ele para tratar de assuntos comerciais. Logo, 2 João 10, que diz "nunca o recebais ...nem o cumprimenteis" não tem um sentido ABSOLUTO para a Sociedade.
Concluindo...
A própria Bíblia também não confere a este texto de 2 João 10 um sentido absoluto, pois em Tiago 5:19, 20, lemos:
"Meus irmãos, se alguém se desencaminhar da verdade e outro o fizer voltar, sabei que aquele que fizer um pecador voltar do erro do seu caminho salvará a sua alma da morte e cobrirá uma multidão de pecados."
Este texto não poderia ser mais claro. Fala de alguém "desencaminhar-se da verdade" e, aos olhos da Sociedade, alguém que rejeita seus ensinos e a abandona é alguém que se desencaminhou da verdade, não é? Nenhuma Testemunha de Jeová poderia negar isso. Sendo assim, qual é o proceder a ser seguido, conforme exortado pelo inspirado Tiago? Se OUTRO o fizer voltar, salvará a sua alma da morte e cobrirá uma multidão de pecados! O texto diz "se outro", não especifica que tem de ser um ancião, um superintendente de circuito ou de distrito.
Qualquer Testemunha de Jeová que creia na Bíblia como a Palavra de Deus está debaixo desta responsabilidade. Deveria procurar tais "desencaminhados da verdade", falar com eles, com o fim de fazê-los "voltar do erro".
O Corpo Governante, todavia, proíbe tal orientação bíblica. E talvez o faça por saber que nem anciãos congregacionais, nem superintendentes viajantes, nem publicadores, nem as publicações dispõem de argumentos BÍBLICOS para fazer retornar aqueles que rejeitam certos ensinamentos da Sociedade.
A organização, no entanto, deveria ter estes argumentos, se ela é, como afirma 1 Timóteo 3:15, "a congregação do Deus vivente, coluna e amparo da VERDADE".